Pesquisadores brasileiros descobriram seis novas mutações nos genes BRCA 1 e 2 em mulheres do país. As alterações indicam risco aumentado de câncer de mama e ovário para suas portadoras. O estudo, realizado pelo laboratório de genômica da Dasa, empresa especializada em medicina diagnóstica, foi apresentado no encontro anual da Sociedade Europeia de Oncologia Médica (ESMO, na sigla em inglês), realizado entre os dias 27 de setembro e 1º de outubro, em Barcelona, na Espanha.
Os cientistas analisaram dados de 1.284 pacientes diagnosticadas ou com histórico familiar de câncer de mama ou ovário em busca de mutações nos genes BRCA 1 e 2. Os resultados mostraram seis variantes genéticas que não haviam sido associadas a um aumento no risco da doença até então.
“Essas variantes ainda não estavam em bancos de dados genômicos de referência pública. A descoberta permite diagnósticos e tratamentos cada vez mais assertivos e individualizados, com mais chances de cura para os pacientes”, explica Gustavo Campana, diretor médico da Dasa.
Na prática, isso significa que até o momento, pessoas que apresentavam essas mutações não eram consideradas com um risco aumentado de câncer. A partir de agora, todos os pacientes testados serão avaliados para essas novas mutações e, se o resultado for positivo, saberão que têm maior probabilidade de desenvolver a doença.
“Essas mutações não haviam sido descobertas em estudos feitos com populações mais homogêneas e foram aparecer em maior prevalência na população brasileira, que é altamente heterogênea e miscigenada. Estudos assim são importantes para descobrir mutações específicas na nossa população, mas que também podem beneficiar pessoas de outros lugares do mundo, uma vez que esses dados estarão disponíveis no banco de dados genômicos de referência pública, que pode ser acessado em qualquer lugar”, explica Campana.
As mutações detectadas pela equipe brasileira foram associadas a uma vasta gama de etnias: Europa Ocidental e Central, judeus da América Latina, África, Ásia, Oriente Médio e ashkenazi, confirmando a mistura da população brasileira. “Apresentar esses resultados no ESMO 2019 mostra que o mapeamento da genética do brasileiro é altamente relevante para a comunidade científica global”, afirma Maria Fernanda Milanezi, pesquisadora do Centro de Diagnóstico em Genômica da Dasa.
Cerca de 8% a 10% dos casos de câncer de mama são hereditários, principalmente em pessoas com histórico familiar da forma precoce da doença. Nos homens, as mutações genéticas são responsáveis pela maioria dos casos de câncer de mama. Embora vários genes estejam associados ao aumento do risco da doença, o BRCA 1 e BRCA 2 são os principais.
Sequenciamento genético
O sequenciamento genético tem como objetivo identificar a probabilidade de desenvolvimento de uma doença em pessoas que carregam determinadas mutações genéticas. No caso dos genes BRCA 1 e BRCA 2, a análise pode indicar um risco aumentado de câncer de mama e tumor. O exame se popularizou em 2013 depois que a atriz Angelina Jolie anunciou que era portadora dos genes e decidiu remover os seios e os ovários para prevenir o risco de desenvolvimento da doença que causou a morte de sua mãe, sua avó e uma de suas tias.
No Brasil a análise desses genes é indicada e coberta por assistências médicas nas seguintes situações: quando há dois ou mais casos de câncer de mama e/ou ovário na família, especialmente em idade precoce (pré-menopausa) ou em parentes próximos (familiares de 1º ou 2º grau), existência de tumor nas duas mamas ou evidência de transmissão vertical (quando mais de uma geração é afetada, especialmente em se tratando de diagnóstico em pares mãe-filha) e em homens. Aqui você encontra a lista completa dos requisitos exigidos pela Agência Nacional de Saúde para cobertura.
Para pacientes com resultado de BRCA1 e BRCA2 anormal, a conduta mais usualmente tomada é o acompanhamento constante, que consiste basicamente de exame clínico e mamografia anuais a partir dos 25-35 anos de idade. A presença destas mutações também aumentam a probabilidade de câncer de ovário, próstata e intestino grosso. Vale ressaltar que resultados normais não significam que a paciente não virá a desenvolver câncer de mama, já que existe a possibilidade do paciente desenvolver câncer de mama devido a outros fatores.
Novas tecnologias na detecção do câncer de mama
Além da genética, outras novas tecnologias, como a inteligência artificial e a biópsia líquida, estão deixando os diagnósticos e prognósticos mais assertivos e menos invasivos.
- Inteligência artificial (IA): algoritmos de IA já estão sendo utilizados para analisar mamografias. O padrão ouro do rastreamento pela mamografia é o peer review ou dupla leitura. Ou seja, o mesmo exame deve ser analisado por dois radiologistas independentes para aumentar a aumentar a sensibilidade e especificidade do diagnóstico. O tipo de discrepância encontrada na mamografia pode representar a redução de 35% a 40% da mortalidade por câncer de mama. “O diagnóstico de câncer de mama precisa ser altamente seguro. Resultados falso-positivos e falso-negativos podem gerar ansiedade, excesso de exames, falsa tranquilidade ou até mesmo complicar um caso simples. Não tem espaço para erro, e o algoritmo aumenta a segurança”, explica Emerson Gasparetto, vice-presidente da área médica da Dasa.
- Biópsia líquida: a metodologia disponível hoje para o estadiamento, ou biópsia tradicional, pode ser invasiva e, portanto, dolorida. A biópsia líquida é um exame de sangue que avalia o plasma sanguíneo do paciente com câncer, independentemente da localização da doença, e contém DNA proveniente do tumor (DNA livre circulante). O exame caracteriza a genética do tumor ou detecta de forma precoce uma recidiva e é essencial para acompanhar a evolução do tratamento/resposta a medicação. Em breve o recurso deve ser utilizado em todas as etapas do tratamento, inclusive detecção precoce
- Teste genético para definição do tratamento: o tratamento do câncer está cada vez mais individualizado e personalizado. Tratamentos indicados para mutações genéticas específicas aumentam a eficácia e segurança para o paciente. Com o câncer de mama, não é diferente. Mulheres com câncer de mama do tipo positivo para receptor de estrógeno (RE+) e negativo para (HER2-), marcadores que aumentam o risco de metástase, podem ser testadas com Endopredict. O teste combina informação genética e patológica do tumor e avalia se o risco de metástases é alto, intermediário ou baixo. Para essas pacientes, as opções de terapêutica após a cirurgia são a terapêutica anti-hormonal com ou sem quimioterapia, de acordo com o risco de recorrência. Aquelas com baixo risco de metástase podem ser beneficiadas apenas da terapêutica anti-hormonal e assim evitar os prejuízos associados à quimioterapia. A função do Endopredict é justamente avaliar o grau do risco de recorrência e auxiliar o médico na melhor decisão de tratamento, que deve ser tomada em conjunto com o paciente.